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Zoológicos são aliados, não vilões

Controversos desde sempre, os jardins zoológicos existem há milhares de anos, mas, recentemente, o debate sobre sua existência veio à tona com força por conta do Projeto de Lei 6432/2016, que propõe o fechamento de todos os jardins zoológicos e aquários do Brasil.


Cada vez mais as pessoas estão conscientes e preocupadas com o bem-estar animal, o que sem dúvidas é muito bom. Mas, por conta da falta de informação e também da existência de alguns zoológicos ruins, que não cumprem seu papel, as pessoas têm uma visão equivocada destes espaços e os veem apenas como centros que lucram e entretêm às custas de animais aprisionados.


De fato, o conceito de zoológico como uma coleção de animais em cativeiro para entreter pessoas perdurou por muito tempo, mas hoje ele não se sustenta mais e já mudou bastante. É claro que num cenário ideal, zoológicos nem precisariam existir. Afinal, animais deveriam ser livres e não privados de sua liberdade. Mas infelizmente vivemos uma realidade em que animais estão perdendo seu habitat, sendo extintos, maltratados e contrabandeados.


Diversos animais advindos do tráfico, de apreensões ou vítimas de atropelamento e maus-tratos não têm condições de se adaptar à natureza, mesmo após tentativas de reabilitação. Neste contexto, os zoológicos figuram como locais que podem manter estes animais e em contraponto exercer funções importantes que contribuem para a proteção de outros indivíduos da espécie, como educação ambiental, conservação e pesquisa.


Educação ambiental


Você já viu uma onça-pintada? E um lobo-guará? E um pinguim? Arrisco o palpite de que a maioria que respondeu sim a essas perguntas observou estes animais num zoológico ou num aquário. Afinal, são pouquíssimas as pessoas que possuem recursos para viajar e observar animais na natureza – e sem dúvidas não há nada que se compare a isso!


Para muitas pessoas, no entanto, os zoológicos são a única forma de entrar em contato com animais silvestres e aprender sobre a importância da biodiversidade. Isso faz destes espaços excelentes ferramentas para encantar e engajar pessoas na proteção dos animais e preservação dos recursos naturais. E para que as pessoas se tornem aliadas na árdua tarefa de conservar a natureza – e precisamos delas! – é necessário que elas estabeleçam esta conexão.


Além disso, nenhuma outra instituição tem o mesmo potencial de alcance dos zoológicos: cerca de 10% da população mundial visita zoológicos e aquários anualmente e quando comparados a outros espaços de divulgação científico-cultural, como museus, bibliotecas e feiras de ciências, os zoológicos recebem muito mais visitantes, o que reforça ainda mais o seu valor para a educação ambiental.



Placas de educação ambiental do Gramado Zoo, que adotou o papagaio-de-peito-roxo como mascote de suas campanhas educativas. © Gramado Zoo.

Conservação


O que muita gente não sabe é que os zoológicos são também excelentes aliados na conservação. Se não fosse pelo apoio financeiro e pelos programas de reabilitação e reprodução de cativeiro de alguns zoológicos, diversos projetos de conservação sequer existiriam e inúmeras espécies já estariam extintas.


Fora do Brasil, podemos citar como exemplo o caso do bisão-europeu (Bison bonasus), um dos maiores herbívoros da Europa, que chegou a ser declarado extinto em 1927. Mas, como ainda havia algumas poucas populações mantidas em zoológicos, sua reintrodução na natureza foi possível e, graças aos intensos esforços de conservação, hoje sua população vem aumentando e seu status de ameaça é classificado como “vulnerável” pela IUCN.


Aqui no Brasil temos o caso dos micos-leões-dourados (Leontopithecus rosalia). Embora a espécie ainda seja considerada ameaçada de extinção, se hoje sua situação está bem melhor que há alguns anos, isso se deve em grande parte aos zoológicos, que foram essenciais para sua reintrodução.


Podemos falar também por experiência própria. O Instituto Espaço Silvestre tem parcerias com diversos zoológicos, que são fundamentais para o nosso projeto de reintrodução do papagaio-de-peito-roxo (Amazona vinacea): além do recebimento dos papagaios que não têm condições de soltura, alguns zoológicos nos encaminham filhotes nascidos em cativeiro para que possam ser reinseridos em seu habitat natural.


Pesquisa


Os zoológicos também promovem, através de pesquisas, o aumento do conhecimento sobre diversos aspectos da fauna silvestre que podem contribuir para a sua preservação na natureza, como reprodução, genética, fisiologia e comportamento. Inclusive, muito do conhecimento veterinário de animais silvestres vem destes locais.


Esclarecendo alguns pontos


Apesar dos papéis importantes que os zoológicos exercem – ou deveriam exercer –, é importante deixar claro alguns pontos sobre nosso posicionamento:


Não há dúvidas de que há zoológicos que se encontram em condições precárias, mas fechar todos eles não resolve o problema, muito pelo contrário. O que aconteceria com os milhares de animais que hoje estão nos zoológicos se eles fossem fechados? Muitos argumentam que a solução para estes animais seriam os santuários – refúgios de animais que não os expõem ao público –, mas o que garante o bem estar dos animais não é necessariamente a ausência de contato com as pessoas. O fundamental é garantir o manejo adequado, visando não apenas suas necessidades básicas – como alimentação, saúde, segurança e abrigo –, mas atender também suas necessidades físicas e comportamentais através de atividades de enriquecimento ambiental, por exemplo. Com a proibição do acesso público, perderia-se todo o potencial de sensibilizar pessoas para questões ambientais e dificultaria fiscalizar como os animais são cuidados. Além disso, é a visitação pública que possibilita a existência dessas instituições.


O que garante o bem-estar dos animais não é necessariamente a ausência de contato com as pessoas, mas o manejo adequado, visando suas necessidades básicas físicas e comportamentais. © Vanessa Kanaan.


Também somos radicalmente contra a retirada de animais da natureza para irem para zoológicos sem que existam fins de conservação. Apenas em casos extremos isso deve ser cogitado: se uma espécie está em vias de extinção, por exemplo, isso pode ser necessário para garantir uma população de segurança. De qualquer forma, esta não é uma realidade na maioria dos zoológicos brasileiros e a retirada de animais da natureza sem licença é proibida pela nossa legislação. Como já mencionado, muitos dos animais que estão nos zoológicos brasileiros são advindos de ações de resgate, apreensões, ou nascidos no próprio zoológico – e, muitas vezes, estes últimos são encaminhados para soltura.


Nosso posicionamento é a favor dos zoológicos que se dedicam aos animais silvestres da nossa fauna e que desenvolvem suas ações dentro de quatro pilares básicos: educação, conservação, pesquisa e lazer. O que é necessário e urgente é fiscalização dessas instituições, bem como a padronização dos seus procedimentos e atividades, e não seu fechamento.


Precisamos lutar contra aqueles que retiram os animais da natureza e os condenam à vida em cativeiro em condições muitas vezes degradantes. Precisamos salvar as espécies que estão em vias de extinção. Precisamos conscientizar as pessoas sobre a importância dos animais silvestres e mostrar a elas que o lugar deles é na natureza. Precisamos fazer as pessoas entenderem que deixar seus animais domésticos soltos é uma ameaça à fauna silvestre. Precisamos combater o atropelamento da fauna silvestre.


Não precisamos acabar com os zoológicos, eles são nossos aliados nessa luta e não vilões!


Fontes:


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